sexta-feira, 22 de agosto de 2025

 


Pausa na rotina para um pensamento raso: antigamente, na época em que os celulares não existiam e boa parte da nossa comunicação era verbal, não existia o tal do ghosting. Ninguém dava chá de silêncio ou cobrava por rapidez nas respostas, imagino eu... O máximo que tínhamos ouvido falar era sobre o filme "Ghost", aquele que o cara morre e ainda dá um jeito de visitar a mulher amada. Egoísmo romântico, talvez... 

O que lembro dessa época impensável para os mais jovens, é que o telefone fixo existia, mas era pouco usado, quando íamos visitar alguém ligávamos ou íamos na surpresa, correndo o risco de não ter ninguém em casa. E tudo bem! Tudo certo, ninguém criava um monólogo nas redes sociais reclamando ou falando mal de quem não se comunica no tempo certo. O tempo era mais lento, a pressa de antes era a lentidão de agora, sem acesso global a tudo e todos a qualquer instante. 

Os relacionamentos não eram tão problematizados por intelectuais em como agir assim se tal pessoa fizer assado, muitos se conheciam do próprio bairro, familiares, vizinhança. Todos eram conhecidos e se conheciam na calçada ao entardecer, quando as crianças jogavam bola, idosos sentavam para conversar, pessoas aleatórias que passavam, saudando coletivamente os grupos reunidos. Era ali que alguns casais se formavam, quando não, nas festinhas de rua, no mercado, na cotidianidade. 

O tal do ghosting ganha força em tempos onde tudo é urgente e todos precisam estar sempre presentes. Desleal e cansativo ter que dar todas as respostas a todo mundo imediatamente. Ninguém consegue estar presente 100% do tempo na vida de ninguém, hoje nem mesmo o vizinho mais próximo se faz conhecido, estamos conversando com quem mora do outro lado do mundo e talvez nem seja gente, corremos o risco de ter uma IA do outro lado da tela. Ninguém para e ouve o outro, são poucos os motivos para confraternizar entre os conhecidos, o que sobra é a correria, bater metas de vida que são inacessíveis, acessíveis somente por aqueles que dizem como e quando fazer, mas também nunca fizeram. 

Vez ou outra um sumiço é transformado em vídeo explicativo por um blogueiro, são criadas soluções e formas de superar, muitos paranoicos tentando responder sobre o próprio propósito de vida, sem perceber que o outro também tem questões pessoais. É verdade que as relações estão mais superficiais, supérfluas, líquidas por causa desse monte de manuais, códigos de conduta, diagnósticos rápidos que tentam nomear tudo rapidamente para saciar nossa fome de informação sem transformar nada em conhecimento. Apenas mais dedos apontados e culpados que nem sabem pelo que estão sendo apontados. 

Feliz talvez seja quem não tem rede social. Como ser achado sem ser julgado onde você precisa estar em prateleiras para agradar um público que não se agrada de nada? Tempos estranhos. Se você sumisse por 5 minutos, seria sumiço 30 anos atrás? Ou seria só mais um dia normal? O ghosting seria um dia sem hiperconexões em um passado distante.

Claro que todo relacionamento precisa de cuidado e manutenção, mas não é válido todo esse medo e insegurança colocado nas mentes juvenis. Nem tudo precisa de resposta rápida, ser para ontem, nem toda demonstração de afeto precisa ser pública, com vídeo, foto, story comprovando e validação nos comentários.

Texto: Pedro Garrido
Edição e Ilustração: Jornal e Livraria Rio de Flores

PedroGarrido é pedagogo, poeta, escritor e palestrante de São Gonçalo - RJ. Participou de diversas antologias e eventos literários nacionais e internacionais, além de ser membro de três academias literárias e de coletivos culturais. Em janeiro de 2021, lançou seu primeiro livro de poemas, "(Uni)Verso". Até agora, publicou quatro obras individuais: "(Uni)Verso" (2021), "duo" (2022), "Teshuvá" (2022) e "Pedrinho e o Cão Brabão" (2023). Também é o criador e produtor cultural do sarau (Uni)versos Livres, realizado mensalmente na Casa de Cultura Heloísa Alberto Torres, em Itaboraí.

Direção Geral
Renato Galvão


Nenhum comentário:

Postar um comentário