sexta-feira, 1 de março de 2024

 


Hoje eu acordei com a cabeça nas nuvens, fazendo as coisas sem propósito algum. Então lembrei-me das conversas entre minha mãe e minha avó, me bateu uma vontade enorme de usar todas as frases, que sempre ouvi.

Para quem visse ou ouvisse de fora, com certeza, iria viajar na maionese, pois duas nordestinas juntas, seria no mínimo cômica a situação.

 — Tu viste, fulana, anda enrabichada por fulano, não tem cabeça, depois daquele fuleiro do Zé, ela está trocando seis por meia dúzia.

— É mãezinha, essas moças de hoje em dia, são descabeçadas, não sabem se guardar. São todas esquecidas, não sabe viver sem um homem.

— Chega de conversa fiada, tenho muito o que fazer, bora pôr a mão na massa, que daqui a pouco o povo chega para comer.

 A conversa sem pé, sem cabeça parava no caminho, voltavam aos afazeres. Vez ou outra, minha avó me olhava, no canto da cozinha, de orelhas em pé, ela não gostava de criança atrapalhando:

— Se não for para ajudar, que não venha atrapalhar. Mas no final, ela sorria sabia que daquelas conversas desconexas, com certeza, renderia uma história. Então sorrindo ela dizia:

— Passa menina, vai procurar o que fazer.

Ao longo de nossas vidas, memórias são um vício, vez ou outra eu me pego ouvindo minha avó. Por muitas vezes eu chorava, com medo de ser reprovada na escola, não que fosse má aluna, até me aplicava, gostava de estudar. Mas sempre fui, cabeça oca, ou melhor, distraída.

Bastava ouvir um passarinho, ou uma voz ao longe, pronto tudo desaparecia, e eu só me concentrava, na melodia do pássaro, ou na voz cantava ao longe.

 — Essa menina vive no mundo da lua, dizia minha mãe. Não sei se eu, viajava tão longe, mas com certeza devo ter ido até lá, em algum momento.

Quando andava encafifada, com algum problema de matemática, chegava a ter dores de cabeça, nunca gostei dessa matéria, então chorava. O choro aliviava meu coração, me levava a viajar, para um mundo de poesia. Depois de escrever sei lá quantas folhas, conseguia voltar e solucionar o desaforado. Para esses momentos, a frase predileta de minha mãe era: “Fazer tempestade em copo d’água”. A tempestade poderia vir, mas eu conseguia resolver o pepino.

Engraçado que até hoje, me pego usando as expressões, me desafiam a escrever, mesmo que faltem as palavras, os sentimentos se misturam, para lá e para cá, bem ou mal alguma coisa aparece.

Ultimamente, tenho estado em alerta, com medo de “meter os pés pelas mãos”. Muitas palavras que se abrigam em meus pensamentos, me causam angústia e pavor. Vejo tantas coisas ruins, acontecendo no mundo, que introspectivamente, tento driblar essa fúria que anda me vigiando, o jeito é: “Fazer vista grossa”, deixar passar a tristeza da impotência.

O bem e o mal, caminham lado a lado, podemos escolher e caminhar do lado certo. Decidi que falar do que gosto, expressar meus sentimentos, olhar os outros com gentileza e gratidão, ameniza esse terror que me assombra. O jeito é: “Dar a volta por cima”, não me deixar levar pela correnteza e sair do possível, para atingir o necessário e quem sabe o impossível. No fim das contas: “Quem não arrisca não petisca”.

Texto: Ivete Rosa de Souza
Ilustração: Jornal Rio de Flores

Ivete Rosa de Souza nasceu em Santo André, no ano de 1955, canceriana apaixonada por histórias. Adora poesia, crônicas e contos. Tem muitas histórias na cabeça, e a poesia que adorna os dias veio para ficar. Dois livros de poesia publicados: Coração Adormecido e Ainda dá Tempo. E em 2022. Participações em 40 Antologias físicas, inclusive pela Rio de Flores Editora, e mais de 10 ebooks. Vou aonde me levar a poesia.

Edição e Direção Geral
Renato Galvão



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