sexta-feira, 15 de dezembro de 2023

 

Imagem 1 - Ilustração Jornal Rio de Flores

Quando menino, ouvia da professora, repedidas vezes, a frase que marcou sua vida, até chegar à maturidade. A mestra falava para a turma: - “Vocês ainda vão ver que eu tenho razão! O Brasil, até o Ano Dois Mil, será uma das maiores e mais ricas nações do mundo!”. E a mestra completava assim, “O Brasil e a China, como potências, vão surpreender o mundo!”

Imagem 2: Quadro “Blábláblá... para a posteridade!”. Por Rocha Maia

A criançada não entendia nada! Tampouco as crianças se interessavam pelo assunto, afinal, o tal “Ano-Dois-Mil” parecia que nunca chegaria; estava muito longe! E os chineses? A molecada pensava que chinês era, apenas, aquele personagem da música de carnaval, um tal que andava na pontinha dos pés! “Lá vem o china ...! Comendo arroz uma vez por mês! Lig-Lig-Lig Lig-Lig-Lig-Lé...!” Sim! Isso mesmo!

O tempo passou! Correu, “pra caramba”! O menino, já adulto, nem percebeu..., o Ano-Dois-Mil passou; e o mundo não acabou! Ano de dois mil e vinte três! Agora, já velho e cansado! O Brasil e o mundo haviam superado a pior fase da Pandemia mortal, originada em Wuhan!  A China, sim, ela está bem colocada no ranking das nações desenvolvidas; porém, tristemente, o Brasil não chegou lá! Continua vivendo de esperança! No máximo é uma potência na produção de alimentos.

Foi então que ele, agora velho, tentou entender a coisa! Qual a razão de ter a saudosa mestra errado no prognóstico? Realmente, ela não fizera profecias, porém, tinha sido sempre categórica na afirmação: “...ainda vão ver que eu tenho razão!”

Teria sido por problema de má interpretação ideológica ou teológica? Ou, então, algo relacionado com tecnologia ou com escatologia? Por certo, não foi coisa relacionada com o ter ou não ter olhos puxadinhos, nem redondinhos! Sem uma comprovação científica razoável, tornava-se complicado justificar o porquê de a “tia” ter errado aquela projeção de tão grande importância; erro capaz de inviabilizar, entre nós, a teoria das megatendências, adotada na futurologia mundial dos Business.

Pensando sobre muitas outras coisas, ele resolveu firmar propósito afirmando que o grande diferencial, entre as duas nações, como problema fulcral, residia na seguinte hipótese: o brasileiro não domina até os dias atuais, corretamente, o método de fazer reunião. Sim, isso mesmo! Nós não sabemos nos reunir de forma competente, visando discutir e buscar soluções para os problemas pessoais, muito menos os comunitários, sejam eles grandes ou pequenos, do bairro ou nacionais. Em família, em empresas, times de futebol, rodas de bar, governos, em toda e qualquer situação, definitivamente, o brasileiro não consegue se reunir com sucesso! Só para ilustrar, vejamos uma situação bastante comum, como as “incríveis” reuniões de condomínio! Elas teriam tudo para dar certo e ter sucesso, mas...! Já esteve em alguma dessas reuniões? Se você falou “sim”, somos capazes de apostar que completou a resposta com uma frase, mais ou menos assim: “E Deus me livre da próxima! Nunca mais participo de baixaria como aquela!” Grande parte dessas assembleias, ditas reuniões, terminam na desunião do Condomínio e severas inimizades, com decisões que são puro papo furado!

Outro dia, fui convidado a participar de uma reunião simples, mas que poderia ter grande importância para os artistas plásticos da região. Não vamos aos detalhes; apenas vou relatar, para não cair no vício da fofoca! Não quero criticar as pessoas, apenas constato o fato de que, os brasileiros, ainda não aprenderam a fazer reuniões, capazes de honrar o nome: REUNIÃO! A palavra já diz tudo: UNIR POSITIVAMENTE AQUILO QUE ESTÁ DISPERSO! Essa narrativa baseia-se em um estudo de caso simplório, para justificar o fato ocorrido!

Alguém, em nome de alguém, convidou alguém, para, quase em cima da hora, participar com alguém de uma determinada reunião, num lugar qualquer, vagamente informado, com pouquíssima estrutura, impróprio para acolher o enigmático público que, supostamente, poderia comparecer. Na convocatória inicial, conforme o caso, feita por escrito, quem assina não é provavelmente autoridade para o caso! Porém, por educação, o que fazemos? Agradecendo a lembrança da inclusão do nosso nome, e como simples convidados concordamos e respondemos que iremos comparecer, como massa de manobra.

Suponha ser com você? Você não se segura, e, em meio à troca de mensagens do grupo no Whatzapp, comete uma forte “indelicadeza”, embora fiel ao espírito da franqueza, e pergunta ao interlocutor, se poderia informar a pauta da tal reunião. Entenda que uma pauta, previamente divulgada, é o mínimo necessário, objetivando justificar o convite para a sua participação naquele bendito evento. Talvez, o interlocutor lhe responda que, a pauta, já foi conversada com a “autoridade” que organiza o evento; mas que, fique tranquilo, lhe será informada em breve!

Cá entre nós! Esse estilo de preparar reunião, nem na China acontece! Segundo estou “informado”, mesmo por lá, onde há um só partido político, quando alguma decisão colegiada vai ser tomada, a pauta é absolutamente “comunicada”, com antecedência, até mesmo para evitar que, justamente no meio do evento, um daqueles “convidados” resolva discordar e fazer “dengo-chiar-pingo”, totalmente fora do que foi previamente combinado! Outro dia, aconteceu isso, numa reunião do Partido. Retiraram do plenário, “gentilmente”, um dos mais antigos membros! Possivelmente, porque não estava mais “podendo-concordar” com propostas a serem unanimemente aprovadas. Uma atitude fora do combinado é coisa que, para eles, é de muito “mau-tio-zé” -gosto! Então, retiraram o ancião do plenário, literalmente à força; parece que botaram ele pra tomar uns goles, de uma bebida muito popular na China, atualmente chamada de drinque “xixi-gin-pinga”! O velho saiu “espontaneamente” carregado do plenário!

Mas vamos deixar os métodos chineses pra lá! Ao que nos parece, por lá eles têm uma forma de reunião que funciona. Vamos cuidar da reunião à moda brasileira!

Assim, aqui, se resolvermos persistir na solicitação de saber sobre a pauta, o que acontece? Vamos esperar, e..., nada tempestivamente acontecerá! Finalmente, faltando menos de vinte e quatro horas para a abertura do evento, vão decidir informar vagamente. Então, mesmo assim, sem graça, agradeceremos! Por questão de formação profissional ou de princípios, será bom agir tal como naquele caso do sapateiro remendão, depois de ser admoestado, por um grande artista, a manter-se dentro dos limites das críticas que lhe eram pertinentes fazer, isto é, sobre a qualidade da pintura das sandálias. Não sobre cabelos ou vestimentas! A vida nos ensina evitar chegar ao nível de incompetência, arriscando ser, como aquele simples sapateiro remendão, um palpiteiro, principalmente quando possa estar presente, no local, alguém com maior competência e saber. Para evitar pagar mico, no dia marcado, poderemos ir à reunião. Lá chegando, aguardaremos o momento certo, para justificar a situação; e podermos nos retirar dos debates. Não há nenhuma razão para permanecer, uma vez que em nada poderemos contribuir, para os melhores resultados do evento, uma vez que, sem tempo para reflexões e estudos prévios sobre os assuntos pautados, nós pouco teremos a dizer. Se resolver ficar na reunião, então prepare-se para uma tempestade de ideias ou, como se diz em Minas Gerais, um enorme “toró-de-parpite”! Afinal, de “achismos” o brasileiro já está bem mal na fita! Somos um país de palhaços de perdidas ilusões, vivendo vã esperança de pisar em chão de estrelas!

“Minha vida era um palco iluminado
Eu vivia vestido de dourado
Palhaço das perdidas ilusões
Cheio dos guizos falsos da alegria
Andei cantando a minha fantasia
Entre as palmas febris dos corações”


“A porta do barraco era sem trinco
Mas a lua furando o nosso zinco
Salpicava de estrelas nosso chão
E tu pisavas nos astros distraída
Sem saber que a ventura desta vida
É a cabrocha, o luar
E o violão”

Imagem 3: Quadro “Chão de Estrelas”. Prêmio Aquisição. 27º Salão Nacional da Primavera. SOARTE. 2019. Por Rocha Maia

Eventos realizados de forma atabalhoada, pouco ou nada contribuem para o crescimento coletivo. Servem só para atender ao clientelismo político de grupos; e de indivíduos pouco comprometidos com as causas comunitárias. As más práticas e técnicas de reunião são desagregadoras e enfraquecem o espírito comunitário. Quando elas deixam de ser observadas, o resultado é o esfacelamento do tecido democrático e a perda da efetividade das decisões, principalmente nas fases posteriores de suas implementações práticas. São reuniões que não passam de esforços inúteis, perda de tempo, na busca de soluções, que deveriam ser eficazes e efetivas, para a solução definitiva de nossos problemas cotidianos, mas não passam de mero blábláblá!

Texto e Telas (Imagens 2 e 3): Rocha Maia
Ilustração: Jornal Rio de Flores

Luiz Roberto da Rocha Maia. Nasceu no Rio de Janeiro/1947. Morou em Teresópolis e Brasília e, atualmente, em Rio das Ostras. Em 2023, completa mais de cinquenta anos de atividade cultural. Membro de diversas entidades culturais, no Brasil e em Portugal, é Fundador da Associação Candanga de Artistas Visuais - Brasília /DF. Membro da Academia Brasileira de Belas Artes – ABBA do Rio de Janeiro; e da Academia de Letras e Artes ALEART, Região dos Lagos/RJ. Participou de mais de duzentos eventos de artes no Brasil, Cuba, Portugal, França e Bulgária. Recebeu mais de setenta premiações e destaques em salões de artes plásticas. Citado em catálogos e sites, possui obras expostas em galerias no Brasil e no exterior; bem como nos acervos do Museu Naïf de São José do Rio Preto/SP; MIAN/Rio/RJ; SESC/SP, na coleção do Château des Réaux; e do Museu Internacional de Arte Naïf de Vicq, na França. Seus quadros estão presentes também em pinacotecas de diversas entidades e coleções de aficionados por arte naïf no Brasil, Cuba, França, Itália, Espanha, Chile, Japão, Bolívia e Portugal. Por três vezes foi selecionado para a Bienal Naïfs do Brasil, tendo recebido o prêmio aquisição 2006, em Piracicaba/SP. Na literatura, publicou o catálogo “Ingenuidade Consciente”, Editora A3 Gráfica e Editora – 2010; o livro “O Diário de Lili Beth”, pela editora Videu – 2021; e colaborou com a Coluna Arte Animal, da revista digital Animal Business Brasil, escrevendo artigos versando sobre a presença de animais como tema nas belas artes.

Edição e Direção Geral
Renato Galvão


 


 


 


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