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| Figura 01 - Ilustração - Tela: “Aos sábados era uma festa por conta da feira!” Rocha Maia |
Corria
o ano de 1990, quando eu tive a primeira grande oportunidade de viajar, durante
muitas semanas, pelo interior do estado do Rio Grande do Norte. Denominados
como potiguares, os nascidos naquele estado brasileiro, receberam essa alcunha,
em razão da grande tribo indígena tupi, que habitava o litoral, desde Mossoró
até João Pessoa. O significado do nome, em tupi, é “Comedor de Camarão”.
Percorrendo
centenas de municípios do Rio Grande do Norte, me foi possível sentir os
contrastes que dominam a região, desde o sertão seco, de calor abrasador, até a
região de transição e a litorânea. Uma viagem longa e demorada, percorrendo de
Natal, a Capital, passando por Mossoró, descendo em direção a Pau dos Ferros,
na região potiguar denominada tromba do elefante, e retornando por Caicó, até
chegar novamente ao litoral, na cidade de Nísia Floresta, onde me foi servido
um fantástico rodízio de camarão.
São
dois mundos, muito diferentes; o sertão, marcado pela cultura do couro, e o
litoral, com dunas formadas pelos ventos suaves, frescos e frequentes. É o
único estado brasileiro com dois tipos de litoral; um fica do lado voltado para
o oceano Atlântico/África, onde recebe os ventos alísios; e o outro, paralelo
ao equador, onde o clima desértico do sertão brasileiro encosta no mar.
Segundo
historiadores, o cangaço teria nascido no interior mais quente do estado
potiguar, lá pelas bandas do município de Patu. Estudos sobre o cangaço revelam
aspectos muito marcantes, típicos do regionalismo sertanejo. Naquela longa
viagem, visitando quase todos os municípios do Estado Potiguar, colhi ricos
subsídios técnicos, para estudo do desastre natural conhecido como Seca.
Pesando
os dados colhidos nas minhas andanças, me foi possível entender a frase de
Euclides da Cunha: - “O sertanejo é, antes de tudo, um forte!”
Interessante
informar que o jornalista, escritor de “Os Sertões”, nasceu no município de
Cantagalo, no Rio de Janeiro. Ele escreveu uma das mais importantes obras da
literatura brasileira, na qual narra a Guerra de Canudos (1896 e 1897). Não vem
ao caso comentar sobre o autor e o livro, apenas vamos focar no fato de que o
escritor usou a denominação “sertanejo...” e não, como frequentemente é divulgado,
“o nordestino é... um forte”.
Mas,
qual a diferença? De maneira geral, aparentemente, fazer referência a
nordestino ou a sertanejo, é a mesma coisa! Ou não? Nesse ponto, chega-se ao
aspecto mais importante daquilo que estou comentando. Nordestinos são todos
aqueles nascidos na região Nordeste, já sertanejos são apenas aqueles nascidos
na região do sertão. Trata-se de um vasto território semidesértico, único,
margeando áreas úmidas e não desertos, como ocorre em outras partes no mundo.
Muitas vezes, confundimos o sertão, ao se fazer referências a ele, como caatinga,
que é um tipo de bioma exclusivamente encontrado e predominante na região
semiárida brasileira.
Saindo
desses conceitos geográficos, vamos olhar mais pelas referências antropológicas
e culturais. Para se compreender, de forma prática essa questão, sobre o sertão
e o sertanejo, recomenda-se aos interessados visitar uma feira livre, em alguma
das cidades mais tradicionais do interior nordestino. Preferencialmente, escolha
para ir aos sábados, numa ocasião em que o povo, com suas raízes de tradições
mais típicas, estará reunido, quase sempre, numa praça ou ruas adjacentes à
Prefeitura e à Igreja Matriz do lugar. Ali são comercializados produtos bastante
tradicionais. Por exemplo aqueles da culinária nordestina, farinhas, feijão de corda,
carne de sol, queijo coalho, pimentas, rapaduras, ervas, garrafadas medicinais
e a inconfundível manteiga da terra.
Vendem
também móveis, sulancas, redes, manufaturas do cotidiano feitas de couro curtido,
utensílios domésticos, trajes usuais dos vaqueiros, e as rendas de bilros. Igualmente,
no melhor estilo, se apresentam artistas de rua, mambembes e artesãos, enquanto
cordelistas ofertam folhetos, impressos de forma rústica, com versos populares,
contando histórias que enaltecem personagens e heróis das caatingas.
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| Figura 02 - Tela: “Aos sábados era uma festa por conta da feira!” – por Rocha Maia 2001 |
Não se admire, se sentir vontade de entrar em alguma birosca, porque lá se apresentam, com toda a força das tradições, os repentistas e poetas, acompanhados de conjuntos de sanfona, zabumba, pandeiro e triângulo. As pessoas cantam e dançam xaxado, baião, maracatu, frevo e forró! Impossível ir lá e passar sem provar tira-gostos, daqueles próprios, para acompanhar generosos goles, da mais pura cachaça nordestina.
Perambulando
pela feira, vá se acostumando a ouvir o dialeto característico. Afinal de
contas, você está em pleno coração da nordestinidade, a mais sertaneja que há!
Não se avexe não! Vá cantando junto..., lembrando do grande Luiz Gonzaga..., “Tamborete
de Forró”:
“Ela era
miudinha
Botei seu nome tamborete de forró
Mas quando ela me deu uma olhada, senti logo uma flechada
Meu coração foi logo dando um nó”
“Tava
tocando um baião cheio de dedo
Quando dei fé, tava tocando Chopin
Menina, você vá me dando asa, que eu levo você pra casa”
A
feira de sábado é uma festa!
E
se ouvir alguém gritar “Oxente, bichinho!”.
“Não se avexe não, cabra!”, é que “vosmice..., botô pra-arrombá!”.
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| Figura 03 - Tela: “Nego Lua Cantando Xaxado”, por Rocha Maia - 2001 |
Luiz Roberto da Rocha Maia –
nasceu no Rio de Janeiro/1947. Morou em Teresópolis e Brasília e, atualmente,
em Rio das Ostras. Em 2023, completa mais de cinquenta anos de atividade
cultural.
Membro de diversas entidades culturais, no Brasil e em Portugal, é
Fundador da Associação Candanga de Artistas Visuais - Brasília /DF. Membro da
Academia Brasileira de Belas Artes – ABBA do Rio de Janeiro; e da Academia de
Letras e Artes ALEART, Região dos Lagos/RJ. Participou de mais de duzentos
eventos de artes no Brasil, Cuba, Portugal, França e Bulgária. Recebeu mais de
setenta premiações e destaques em salões de artes plásticas.
Citado em catálogos e sites, possui obras expostas em galerias no Brasil
e no exterior; bem como nos acervos do Museu Naïf de São José do Rio Preto/SP;
MIAN/Rio/RJ; SESC/SP, na coleção do Château des Réaux; e do Museu Internacional
de Arte Naïf de Vicq, na França. Seus quadros estão presentes também em
pinacotecas de diversas entidades e coleções de aficionados por arte naïf no
Brasil, Cuba, França, Itália, Espanha, Chile, Japão, Bolívia e Portugal.
Por três vezes foi selecionado para a Bienal Naïfs do Brasil, tendo recebido o prêmio aquisição 2006, em Piracicaba/SP. Na literatura, publicou o catálogo “Ingenuidade Consciente”, Editora A3 Gráfica e Editora – 2010; o livro “O Diário de Lili Beth”, pela editora Videu – 2021; e colaborou com a Coluna Arte Animal, da revista digital Animal Business Brasil, escrevendo artigos versando sobre a presença de animais como tema nas belas artes.
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| Edição e Direção Geral Renato Galvão |




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Parabéns Luiz Roberto. Muito bacana e interessante o conteúdo do seu texto. *Lira Cecília *
ResponderExcluirMuito obrigado por comentar meu texto. Fico feliz. Att.
ExcluirParabéns. Sucesso sempre.
ResponderExcluirMuito obrigado Rô!
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