Em
seu livro Como se escreve a História,
Paul Veyne ensina que o historiador não dispõe de todos os elementos para contar a
História tal qual ela aconteceu. Por isso, ele se baseia em documentos,
indícios, depoimentos ou até mesmo em achados arqueológicos.
O
exemplo usado por Paul Veyne é a Batalha de Waterloo ,
em que o conhecido e tantas vezes vitorioso Napoleão Bonaparte é derrotado. Que fatos são contados para a posteridade? Os eventos vistos sob a
ótica dos vencedores? Os acontecimentos como eles foram vistos por Napoleão?
Decerto, jamais teremos a oportunidade de conhecer o ponto de vista dos
soldados que acompanhavam Napoleão.
Em
termos literários, valho-me, costumeiramente, do romance Os varões assinalados,
de Tabajara Ruas que aborda a Guerra dos Farrapos, levante
ocorrido no Rio Grande do Sul, que pretendia
a independência em relação ao restante do Brasil, como acontecera com o Uruguai.
Há
uma passagem da narrativa, em que os combatentes dirigem-se até as imediações
do porto de Rio Grande,
única saída marítima da então província. Pretendiam avançar sobre a vila de São João do Norte e forçar uma saída para o mar. Contudo, eles são surpreendidos, atacados pelas
tropas fiéis ao Império e necessitam fugir. Os líderes, montados em cavalos,
saem mais rapidamente e retornam ao acampamento de origem com brevidade. Consta
que os soldados, famintos, sujos foram chegando durante dois ou três meses.
Paul
Veyne procura explicar que o historiador, assim como o romancista, tece
histórias que contemplam aspectos que a História ocultou, que os homens/as
mulheres do passado não permitiram acesso. Assim, a História constitui uma
narrativa de fatos, mais ou menos, verdadeiros, mas mutáveis, se surgirem novos
elementos que permitam reler, rever.
JacquesLe Goff,
em seu clássico livro História e Memória,
afirma que memória e esquecimento estão muito próximos e o desejo dos
detentores do poder – político, econômico, midiático – é assenhorar-se da
memória, inclusive, histórica para manter a população, digamos, em uma bolha,
apartada de questionamentos, de reflexões sobre passado e presente.
Costumeiramente,
as pessoas têm-nos dito: “Não suporto mais tanta informação”; “Já nem vejo mais
televisão”. Parece haver uma exaustão – meio coletiva – a respeito do excesso
de notícias, notícias falsas, debates vazios. Por outro lado, o conhecimento científico
ou a ciência propriamente dita tem sido posta em cheque, em dúvida.
Confesso
que, neste sentido, sinto grande dificuldade para o entendimento dos
pressupostos que regem as pessoas, sou pragmática demais – já disseram-me que
sou cartesiana demais. Ainda assim, noto uma contradição: nega-se o uso da
vacina, mas se usa um medicamento para tratar diabetes como auxílio para o
emagrecimento. Quais os efeitos futuros?
Ah, esqueci! A ciência não tem validade para a
maioria das pessoas.
Na
prática, a minha reflexão vai no sentido de: “para onde caminhamos?”, se não
mais assentamos o nosso pensamento em reflexões que foram sendo tecidas ao
longo das últimas décadas.
Há
uma discussão recorrente no âmbito da Literatura, que acabo trazendo para a
vida não ficcional, para o mundo “real” (ainda que eu não saiba o que isso
significa): repete-se, com frequência, que o texto narrativo, o romance, não
tem novos caminhos a seguir.
A nossa exaustão retirou-nos a “confiança” na ciência, o pragmatismo político e leva-nos a perder a capacidade imaginativa? É a inteligência artificial (em suas mais variadas concepções) dominando a criatividade e a liberdade de pensamento? Para onde, pois, caminha o humano que há em nós?
Texto e Banner: Elaine dos Santos


Nenhum comentário:
Postar um comentário