Gostaria de
dividir, com mais pessoas, essa experiência no trato da questão da autoestima!
Primeiro, devo confessar, eu demorei muito para aprender a lidar com esse tipo
de sentimento de percepção pessoal das minhas qualidades. O tempo que cada um
de nós necessita, para apropriar essa consciência pessoal, é muito diferente;
irá depender de fatores de percepção da realidade, dentro de nosso próprio “calendário”
de vida. Creio que, até completar minha puberdade, eu tinha algum tipo de
deficiência de cognição; talvez sofresse de déficit de atenção ou de dislexia.
Nunca soube se houve algum diagnóstico de médicos, confirmando aos meus pais aquelas
minhas dificuldades. Por certo, eles sabiam e as professoras também; fizeram o
melhor para me entender e ajudar.
Antigamente,
o TDAH ainda não era uma “doença-da-moda”! O que sei? Eu tinha muita
inteligência, porém era mal direcionada. Como estudante, logo no primário, eu
tive muita dificuldade nos estudos. Qualquer coisa servia como motivo para
desviar minha atenção. Concentração zero, principalmente se o assunto não
estivesse muito interessante. Eu “viajava” facilmente, desviando meus
pensamentos para histórias que eu próprio inventava. Eu criava personagens
bastante fantasiosos; eu e eles dialogávamos, eram assuntos cheios de
criatividade, como quimeras. Os cenários surgiam por meio dos meus desenhos.
Creio que, de forma visual muito ingênua, reproduziam as minhas mensagens. Talvez, de outra forma, com as letras por
exemplo, poderiam ser mais facilmente transmitidas e compreendidas, mas eu me
complicava, quando tinha de usar o alfabeto, respeitando regras gramaticais.
Entretanto,
eu gostava de ouvir minha própria voz! Então, protagonizei algumas façanhas
inexplicáveis! Uma delas foi ter conseguido chegar à quinta série, sendo o
aluno orador, na formatura da minha própria turma, embora, no final, tenha sido
o único reprovado. Realmente, ser o “orador” foi uma conquista gloriosa, mas
repetir a Quinta Série deixou-me sentir um certo gosto de “burrice”! A tal da
falta de qualidade como me classificavam, acompanhava-me com grande
insatisfação, não só com a minha própria identidade, mas ainda com dificuldades
para me relacionar com amigos. Por alguns anos, após aquele evento glorioso,
mas vexaminoso, prendi-me à falsa imagem de ser uma pessoa insegura, e
incapaz de me valorizar. Eu tinha uma fraca autoestima. Falando sério,
reconheço, eu nem sabia o que significava a palavra, tampouco discutia a
questão pelo aspecto da forma correta da grafia, se seria separando ou juntando
palavras!
A
inteligência felizmente estava viva e preservada, lá bem no fundo da minha cachola!
A psicologia estuda melhor essa questão, confirmando ser a autoestima a forma
específica de uma pessoa avaliar a si mesma. No meu caso, era uma forma de
baixa autoestima, onde eu me negava possuir propriedades de amor-próprio, como a
confiança e o respeito às qualidades, fortemente presentes na minha
personalidade. Afinal, pensando melhor, ser o aluno escolhido, por unanimidade,
para fazer o discurso de formatura de uma turma, mesmo sendo uma Quinta Série
Primária, no mínimo, demonstra que o orador teria um elevado grau de liderança
sobre o grupo. Por consequência, sendo orador de turmas ou professor paraninfo,
como fui por diversas vezes, ativou a função de liderança, coisa que, por meio
da retórica, acompanhou-me pela vida afora.
Porém, o
problema está justamente nesse ponto. A baixa autoestima é um fenômeno que
abala o amor-próprio, tira o orgulho e estremece os brios e a honra, destruindo
a altivez e derrotando a dignidade da pessoa. E o pior de tudo é que, o efeito
sobre o indivíduo, acaba por contaminar negativamente o ambiente coletivo
adjacente, onde a pessoa estabelece seus laços. Muitas vezes dispara sintomas da
depressão na forma coletiva. Como se fosse aquele efeito do castelo de cartas,
umas derrubando as outras. Por outro lado, viver em meio ambiente saudável,
seguro e positivo, facilita para fortalecer a pessoa nas situações de baixa
autoestima, porque as outras pessoas se apoiam e auxiliam o indivíduo a vencer
as crises de queda no amor-próprio.
Encontrei
nas práticas artísticas, especialmente com a pintura naif, uma poderosa forma
de vencer a baixa autoestima. Já vitorioso naquela luta inicial, por criar
confiança e segurança, em relação aos meus potenciais, pude conferir o papel
altamente positivo das artes plásticas na autodescoberta de valores e
qualidades, por meio de oficinas de criatividade com meus alunos. Vale
ressaltar que as experiências foram feitas repetidas vezes, com turmas de
variadas faixas etárias, durante realização de eventos no Ateliê Luz Dourada,
na Faculdade de Administração e em programas de qualidade de vida em empresas
públicas e privadas. Não posso afirmar que as artes plásticas sejam panaceias,
para a reabilitação de pessoas inseguras e ansiosas, tampouco que possam ser
usadas indiscriminadamente, como solução para correção da baixa autoestima.
Aconselho sim a aplicação moderada das atividades artísticas, como coadjuvantes
na terapia ou na ocupação de tempo ocioso de uma pessoa. Contudo, garanto que os
resultados positivos serão percebidos!
Em casos
observados com diagnósticos específicos do transtorno TDAH, possivelmente, as
belas artes ajudaram na fixação de atenção e concentração, ajustando o
comportamento com máximo foco no resultado desejado. Igualmente, para certos
casos leves de autismo, foi possível verificar, em qualquer idade, que as artes
plásticas abriram interfaces para comunicação, entre o mundo autônomo de uma
pessoa autista, com a realidade exterior, muitas vezes distante das
características da própria introspecção mental do autismo.
Uma
experiência vitoriosa, envolvendo essa abordagem, com o uso das artes plásticas,
buscando melhoria da autoestima, ocorreu, em Brasília, por ocasião da
realização do projeto denominado Salão Infanto-juvenil Brincando com Arte, cujo
modus-operandi vou resumir, para não cansar. Tratava-se de um concurso
anual, para incentivar a educação nas escolas, voltado aos aspectos formais das
ações da Companhia do Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba
(CODEVASF), a serem apresentados artisticamente, por meio de desenhos, pinturas
e esculturas. Participavam alunos de escolas da rede pública ou privada que,
dentro de critérios previamente estabelecidos, concorriam em diversas
categorias, tendo como incentivo belas premiações de materiais e equipamentos
artísticos, para pintura e desenho.
No último
dia de realização de cada Salão, após a entrega das medalhas, certificados e
prêmios, os alunos e seus familiares eram brindados com um lanche de
confraternização. Por ser um evento que se repetia, foi possível acompanhar
alguns casos interessantes, que bem demonstraram o efeito benéfico das artes
plásticas, como instrumento para alavancar a autoestima, dentre outras
vantagens para os jovens participantes, individualmente, bem como de seus parentes,
muitas das vezes oriundos de famílias humildes. Ao final da experiência,
notava-se a alegria e felicidade de todos, por terem participado, sentindo-se
orgulhosos por serem tratados como Artistas. Foi possível, após alguns anos,
com informações transmitidas por professores de artes, saber sobre condições de
evolução de alguns participantes dos Salões Brincando com Arte. Constatamos
casos de jovens que, com certa facilidade, conseguiram firmar-se, social e profissionalmente,
em segmentos e interfaces com as artes plásticas, especialmente no ramo de
desenho de moda e confecção; e atividades de cartazistas e de criação gráfica
para fins mercadológicos. Entretanto, com bastante segurança, o que pudemos
captar da experiência, nas escolas, foi que a grande maioria dos alunos
obtiveram melhoria substancial em questões cognitivas, afetivas,
comportamentais e de sociabilização, após terem passado pela experiência.
Por fim, possivelmente,
como resultado mais positivo dentre casos estudados, tanto em oficinas de
criatividade como em workshops nos ateliês, compensa fazer referência aos
recentes últimos anos, após o término da pandemia do Covid 19. Os longos
períodos de isolamento social, associados ao terror psicológico, causado pelas
diversas medidas de prevenção e pela insegurança das falsas informações,
transmitidas diariamente pela mídia, produziram danos profundos nas estruturas
psicossociais, econômicas e educacionais, em estágios de difícil avaliação dos
males causados nas pessoas.
Inúmeros foram os casos, independentemente da faixa etária, sexo ou estrato social, que procuraram e encontraram melhoria das suas condições patológicas, por meio do simples aprendizado de desenho e pintura artística. Associando fatores positivos de ambientação e de instalações adequadas às práticas das artes plásticas, em condições pedagógicas adequadas, foi possível perceber como o retorno positivo se tornou factível aos anseios dos alunos clientes. As avalições nos feedbacks mostraram, com segurança, que os resultados obtidos foram positivos e verdadeiros, justificando plenamente a continuidade do projeto.
Ilustração: Jornal Rio de Flores
Luiz Roberto da Rocha
Maia. Nasceu no Rio de Janeiro/1947. Morou em Teresópolis e Brasília e,
atualmente, em Rio das Ostras. Em 2023, completa mais de cinquenta anos de
atividade cultural.
Membro de diversas
entidades culturais, no Brasil e em Portugal, é Fundador da Associação Candanga
de Artistas Visuais - Brasília /DF. Membro da Academia Brasileira de Belas
Artes – ABBA do Rio de Janeiro; e da Academia de Letras e Artes ALEART, Região
dos Lagos/RJ. Participou de mais de duzentos eventos de artes no Brasil, Cuba,
Portugal, França e Bulgária. Recebeu mais de setenta premiações e destaques em
salões de artes plásticas.
Citado em catálogos e
sites, possui obras expostas em galerias no Brasil e no exterior; bem como nos
acervos do Museu Naïf de São José do Rio Preto/SP; MIAN/Rio/RJ; SESC/SP, na
coleção do Château des Réaux; e do Museu Internacional de Arte Naïf de Vicq, na
França. Seus quadros estão presentes também em pinacotecas de diversas
entidades e coleções de aficionados por arte naïf no Brasil, Cuba, França,
Itália, Espanha, Chile, Japão, Bolívia e Portugal.
Por três vezes foi
selecionado para a Bienal Naïfs do Brasil, tendo recebido o prêmio aquisição
2006, em Piracicaba/SP. Na literatura, publicou o catálogo “Ingenuidade
Consciente”, Editora A3 Gráfica e Editora – 2010; o livro “O Diário de Lili
Beth”, pela editora Viseu – 2021; e colaborou com a Coluna Arte Animal, da
revista digital Animal Business Brasil, escrevendo artigos versando sobre a
presença de animais como tema nas belas artes.
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| Edição e Direção Geral Renato Galvão |


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