domingo, 21 de julho de 2024

 


Terra é pó, com água vira barro! Acrescenta-se a isso as mãos do oleiro e..., com fogo? Tem-se o que? Caso essas coisas aconteçam, com a intervenção das mãos do genial Sérgio Amaral, então tudo vira arte! Nascem assim os Matarrachos!

Antes de falar sobre os tais dos Matarrachos, quero esclarecer algo sobre ANTROPOMORFISMO! Antropomorfismo é uma forma de atribuir ideias que conferem características ou aspectos dos seres humanos aos animais, a entidades e elementos da natureza ou seres constituintes do imaginário em geral. Por exemplo, nesse sentido, toda mitologia da antiga Grécia, é antropomórfica.

Outra acepção de antropomorfismo refere-se a dar característica humanas a bichos, insetos ou objeto inanimados usado originalmente em contos morais, como as histórias de fadas e livros infantis. Tem tido uma grande expansão, graças à criação dos desenhos animados, ainda mais com o surgimento dos grandes estúdios, como os da Disney.

Voltamos, então, ao artista plástico Sérgio Amaral.

 

Fomos apresentados ao ceramista lusitano que cria Matarrachos. Na ocasião ficamos muito curiosos, e, ao sermos convidados, fomos visitar o artista e o local onde trabalha!

Ficamos hospedados, num ambiente encantador, como convidados Vips. O endereço parecia estranho: Rua das Cabeças, Santa Luzia, Mangualde, Portugal. Ateliê Casa dos Matarrachos. Repetimos visitas nos anos: 2009, 2010; 2011 e 2012.


Contando-se com um cicerone, tal como Sérgio Amaral sabe ser, é impossível não aproveitar a viagem da melhor forma possível. Sabe, aquele tipo de passeio que só se vê nos vídeos de reportagem turística da melhor oferta de roteiro cultural especializado? Foram assim aquelas viagens a Portugal! Conhecemos o ateliê de um dos mais renomados ceramistas lusitanos da atualidade. Sendo um profundo conhecedor dessa arte ancestral, para trabalhar o barro e o vidro, das maneiras mais primitivas, antigas e variadas que há na Terra, ele nos permitiu conhecer variados métodos e técnicas da produção da olaria. Além da simpatia pessoal, Amaral é um ser totalmente preparado para, didaticamente, apresentar aos visitantes as etapas de criação de sua arte.

Exatamente, ele é como dito na entrevista que está na Internet: “Sérgio Amaral é um ceramista genuinamente português, que tem vindo a conquistar um lugar único no contexto da cerâmica de sua terra natal, cruzando, com as suas figuras antropomórficas – os matarrachos – os campos da plástica popular e da estética contemporânea. Nascido em 1959, em Mangualde, é ele que, por um certo acaso, contacta, na década de 1980, com a produção de olarias de Molelos, onde se mantinha à época alguns processos de fabrico primitivos. Passa a frequentar a oficina para aprender as técnicas de produção, começando rapidamente a criar as suas próprias peças. O contacto com o Mestre Zé Maria, de Ribolhos, será fundamental na sua decisão de se dedicar exclusivamente ao figurado.” (https://www.artepopularportuguesa.org/sergio-amaral/)

Desde então, com os matarrachos – construídos através de técnicas distintas, que Sérgio Amaral faz questão de continuamente pesquisar e aprender – tais peças constituem o centro da sua produção. Nos últimos anos, ele tem se dedicado a tornar o seu ateliê, em Mangualde, num espaço de partilha e aprendizagem, realizando cursos, workshops e eventos em torno da atividade de olaria.


Como um mestre nessa arte tridimensional da modelagem do barro, Sérgio Amaral também é um profundo conhecedor das riquezas da arqueologia em Portugal. Revirando a terra, ele é uma espécie de arqueólogo, que, na terra cavada, encontra traços de civilizações muito antigas. Continua sempre cavando! Sempre cavando, amassando e misturando e queimando o barro. Muitas vezes, são simples vestígios; coisas de pouca importância aos olhos não treinados.

Talvez tenha sido exatamente por essa razão, que fomos conhecer, pelas mãos dele, sítios arqueológicos maravilhosos naquelas terras lusitanas. Por vezes, apenas pequenos sítios que afloram no solo ou são escavados logo abaixo dos pés; são locais onde talvez restem pedaços de ossos, alguns vestígios milenares de fogueiras ou de madeiras chamuscadas carcomidas por insetos. Os achados são muito frágeis ao simples toque; terminam danificados, outras vezes basta, para tanto dano, um simples contato com o ar e a luz solar. Finalmente, sendo depurados aqueles vestígios, alguns cacos de cerâmica emergem, revelando o estágio de civilização dos serem humanos que fabricavam aqueles objetos utilitários domésticos. Em determinados casos, pequenas figuras revelam, pela estatuária e pela pintura de relevos pictóricos, as condições da religiosidade ou das práticas de caça e de guerra, além de outros elementos cotidianos daqueles habitantes primitivos.

Foi com a orientação do amigo Sérgio que pudemos conhecer, um pouco, da fenomenal riqueza arqueológica de Portugal. Iniciamos visitando o monumento megalítico Anta da Cunha Baixa; fomos ver vestígios de antiga estrada Romana; depois, o sítio arqueológico da Quinta da Raposeira; e terminamos nas ruínas das Termas Romanas de Conímbriga.

        

Mas sempre voltamos a Mangualde, onde o nosso cicerone nos acolheu diversas vezes. No aconchego do belíssimo ateliê Casa dos Matarrachos, pudemos perceber o amor como Sérgio Amaral empreende seu trabalho diário, para produzir aquela cerâmica fantástica, dentro de fornos que ele próprio constrói, com a maestria das mais antigas tradições da olaria, e operando com técnicas milenares. No ano de 2011, em Mangualde, o Ateliê Casa dos Matarrachos, contando com o apoio das autoridades municipais e presença de importantes artistas, ele patrocinou o lançamento do livro/catálogo de arte naïf, Ingenuidade Consciente, autoria de Rocha Maia.

 
Na imagem, Rocha Maia, durante lançamento do livro/catálogo- 2011, em Mangualde.

Nas oportunidades que tivemos de conviver, com Sérgio Amaral, ainda que por apenas alguns dias, pudemos testemunhar a importância e o carinho, com que ele exerce dignamente as suas funções como artista e como educador, recebendo, anualmente, centenas de alunos das escolas locais. Trata-se de atividade de grande relevância, para a formação cultural de gerações futuras, promovendo, desde tenra idade, a oportunidade de aprender a valorizar essa arte tão antiga de transformação do pó no barro, queimado em altas temperaturas, resultando finalmente em arte.

Concluindo, por questão de justiça ao grande artista, queremos acrescentar que a produção artística desse mestre, da criatividade no barro, vai além da simples genialidade.  Transforma-o num escultor contemporâneo e excelente pintor.

Meu amigo Sérgio Amaral consegue reunir qualidades humanas, muito importantes e atualmente raras: humildade, fraternidade e fé!  

Texto e Fotos: Rocha Maia
Ilustração: Jornal Rio de Flores  

Luiz Roberto da Rocha Maia. Nasceu no Rio de Janeiro/1947. Morou em Teresópolis e Brasília e, atualmente, em Rio das Ostras. Em 2023, completa mais de cinquenta anos de atividade cultural.

Membro de diversas entidades culturais, no Brasil e em Portugal, é Fundador da Associação Candanga de Artistas Visuais - Brasília /DF. Membro da Academia Brasileira de Belas Artes – ABBA do Rio de Janeiro; e da Academia de Letras e Artes ALEART, Região dos Lagos/RJ. Participou de mais de duzentos eventos de artes no Brasil, Cuba, Portugal, França e Bulgária. Recebeu mais de setenta premiações e destaques em salões de artes plásticas.

Citado em catálogos e sites, possui obras expostas em galerias no Brasil e no exterior; bem como nos acervos do Museu Naïf de São José do Rio Preto/SP; MIAN/Rio/RJ; SESC/SP, na coleção do Château des Réaux; e do Museu Internacional de Arte Naïf de Vicq, na França. Seus quadros estão presentes também em pinacotecas de diversas entidades e coleções de aficionados por arte naïf no Brasil, Cuba, França, Itália, Espanha, Chile, Japão, Bolívia e Portugal.

Por três vezes foi selecionado para a Bienal Naïfs do Brasil, tendo recebido o prêmio aquisição 2006, em Piracicaba/SP. Na literatura, publicou o catálogo “Ingenuidade Consciente”, Editora A3 Gráfica e Editora – 2010; o livro “O Diário de Lili Beth”, pela editora Videu – 2021; e colaborou com a Coluna Arte Animal, da revista digital Animal Business Brasil, escrevendo artigos versando sobre a presença de animais como tema nas belas artes.


Edição e Direção Geral

Renato Galvão


 

 


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