sexta-feira, 2 de fevereiro de 2024

 


A mãe abriu uma grande cômoda no quarto que seria de Luciana, e encontrou roupas de camas, toalhas, e até roupas de menina. O advogado disse antes:

— Senhor Antônio, o Senhor Manuel, seu tio, já havia feito o testamento em seu nome, deixado claro que o senhor tivesse tudo de bom e do melhor, ele não teve esposa ou filhos, o Senhor é sobrinho direto, ele era irmão de sua mãe.

Dona Maria separou toalhas, deu a cada filho e mandou que se banhassem, que ela iria preparar algo para comerem, já começara a anoitecer. Luciana foi primeiro, por instruções da mãe. Tomou um banheiro rápido, trocou as roupas por uma camisola, em seguida foi à cozinha, no caminho sentiu uma mão tocar de leve o seu braço, correu como se tivesse rodas sob os pés.

 — Que correria é essa menina? Ela apenas sorriu, mas seu coração pulava feito um coelho, por dentro do peito.

Na terceira noite naquela casa, o pai sentado no sofá estampado, ria das conversas do rádio. A mãe desfiava linha, para bordar um dos lençóis da cama grande, os meninos acharam carrinhos de madeira, e uma bola, brincavam aos pés dos pais. Luciana com um livro nas mãos, estava no seu quarto lendo um conto de fadas. Sentiu novamente uma mão tocar seu braço esquerdo. Desta vez ela não se mexeu, com a voz estrangulada, quase um sussurro perguntou:

 — Quem está aí? Por que fica me tocando? E ouviu:

 — Sou seu tio avó, menina. Ela tremeu, continuou parada por algum tempo e tornou a perguntar:

 — O que o meu tio avó quer dizer? A voz falou calmamente:

 — Diga a seu pai, para procurar um baú, enterrado no galpão no quintal dos fundos. E sumiu. Nada de vulto, nada de voz. Luciana saiu do quarto devagar, chegou na sala e falou:

— O finado tio Manuel, mandou que meu pai procurasse um baú, no galpão do quintal, disse que está enterrado lá. O pai, parou de rir:

— Mulher. O que essa menina falou? A mãe repetiu. Ele nem perguntou, como ela soube, saiu do sofá, correndo para o galpão.

Era uma construção de madeira, ao contrário da casa muito bem construída de tijolos aparentes. Tinha um candeeiro pendurado, em frente a porta grande, com ferrolhos de ferro.

O senhor Antônio era um homem crente em presságios e aparições, já tinha visto coisas inexplicáveis, procurou por uma pá e levantou as tábuas do assoalho, viu onde a terra estava diferente, mais fofa, e cavou, a uns cinquenta centímetros abaixo, achou um grande caixote. Não conseguiu remover, encontrou cordas e uma polia, amarrou em uma das traves do teto, era muito pesado, mas com a ajuda da esposa e a filha, retirou o baú. Sobre a bancada do outro lado do galpão viu algumas chaves, pegou e foi tentando uma a uma, por mais incrível que possa aparecer, a última abriu o baú.

 Ficou espantado como o tanto de ouro que havia ali. O brilho refletia até o teto. Nesse momento o velho Senhor Manuel apareceu. Marido, mulher e filhos ficaram estáticos:

— Meu querido sobrinho, vivi só a minha vida inteira, fui um coronel da cana de açúcar. Tudo o que eu fazia era acumular ouro, muitos perderam a vida, tentando encontrar meu tesouro. Agora que estou no outro lado da vida, vejo que fui um grande sovina. Um velho idiota, então meu filho, procure em meus pertences, no seu quarto de dormir, uma lista dos homens que morreram a meu serviço, procure a família de cada um, e dê uma barra de ouro. Fique tranquilo, que tem o bastante, para dar e cuidar dos seus, só assim terei paz. E olhando para Luciana disse:

— Menina sua missão é ser a voz dos que já partiram, não tenha medo. E desapareceu. Luciana morou naquela casa, por mais de oitenta anos, era conhecida como: A curandeira, a mulher que mostrava, o caminho da luz aos que já partiram.

Texto: Ivete Rosa de Souza
Ilustração: Jornal Rio de Flores
 
Ivete Rosa de Souza nasceu em Santo André, no ano de 1955, canceriana apaixonada por histórias. Adora poesia, crônicas e contos. Tem muitas histórias na cabeça, e a poesia que adorna os dias veio para ficar. Dois livros de poesia publicados: Coração Adormecido e Ainda dá Tempo. E em 2022. Participações em 40 Antologias físicas, inclusive pela Rio de Flores Editora, e mais de 10 ebooks. Vou aonde me levar a poesia.

Edição e Direção Geral
Renato Galvão


 
 

 

 

 


Um comentário:

  1. Adoro o seu estilo de escrever. O tema é muito interessante e bastante instigante. Maravilhoso "causo" !

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