O termo “medalhão” não é estranho àquela
parte da população brasileira que já passou dos 60 ou 70 anos. Trata-se, em
sentido figurado, de uma pessoa de destaque, um figurão, que, no entanto,
recebe esse destaque sem merecer ou sem possuir qualidades para tal.
Em “Teoria do medalhão”,
o genial Machado de Assis tematiza essa questão: o idiota que ascende social e
politicamente com um discurso tosco, com vocabulário paupérrimo, sem conhecer
legislação ou etiqueta social, valendo-se de piadas infames. É, enfim, alguém
que deseja parecer o que não é.
Lembro que, anos atrás, tentando
qualificar um indivíduo dessa estirpe, uma amiga saiu-se com: “Ele é um sujeito
‘exótico’, não sabe sequer portar-se à mesa”. De fato, dependendo do ambiente, o
sujeito passa vergonha se não se recolher à sua condição de idiota.
No conto machadiano, o jovem completou 21
anos, encerrou-se a festa e o pai chama-o para uma conversa “de homens adultos”,
ensinando como ser um “medalhão”. De antemão, deve-se dizer que o pai é um
sujeito socialmente frustrado que deseja realizar-se no futuro do filho, o que
começa por um emprego público estável e bons rendimentos mensais.
A sempre estupenda ironia de Machado de
Assis acha-se presente (aliás, ironia que se tornou proibitiva nos dias atuais,
as pessoas não entendem uma ironia e acreditam que se trata de deboche raso): o
pai aconselha o filho a abrir mão de ideias próprias, portanto, ele não deve
manifestar a sua opinião, apenas concordar com o interlocutor; deve mudar os
seus hábitos adolescentes, alterar os seus gostos, os seus costumes etc. com
vistas a agradar a sociedade.
O pai afirma que o filho deve ter um
vocabulário bastante limitado, ter pouco conhecimento para não se intrometer em
discussões que possam melindrar pessoas influentes (detentoras de poder
político/econômico), deve valer-se de piadas simples, que não exijam raciocínio.
Contudo, é importante que conheça algumas frases feitas, aquelas usadas pelo
senso comum e que possam ser introduzidas em momentos oportunos para causar
impacto entre os ouvintes, “pérolas da sabedoria popular”.
O candidato a medalhão deve desprezar
qualquer originalidade – tudo que for novo deve ser rechaçado, afinal, as
pessoas, de uma forma geral, são muito apegadas aos seus hábitos, aos seus
costumes, querem a permanência do seu modo de vida, da sua estabilidade. Elas têm
medo da mudança! É conveniente mantê-las com esse medo e acomodadas em seu
conservadorismo. Jamais provocar indagações, fazer questionamentos: ninguém
gosta de pensar, é cansativo!
Há um trecho bem interessante: não
explique sobre criação de carneiros, mate alguns carneiros e ofereça-os como
jantar aos seus amigos/conhecidos. É importante nessa ação – o jantar – fazer a
sua divulgação: notas em jornais, por exemplo. Aliás, todo acontecimento
envolvendo um medalhão deve ser notícia. As pessoas precisam/devem lembrar-se
dele. Se a ação teve algum mérito, pouco importa; o importante é aparecer.
Os conselhos não param por aí: é
fundamental frequentar lugares conhecidos (“da moda”) e ser fotografado ao lado
de pessoas famosas, personalidades conhecidas não importando o setor a que
pertençam (trata-se do nosso tradicional “papagaio de pirata”).
Por fim, se tiver a oportunidade de
discursar, o medalhão deve comover o público, fazê-lo emocionar-se,
reafirmando, claro, o seu compromisso com os mais necessitados, com a paz e...”cê
sabe, né”?!


É maravilhoso tê-la nesse blog e uma honra lê a sua coluna, querida. Sempre com abordagens exclarecedoras e temáticas interessantes para todo aquele que deseja se deleitar com uma boa leitura.
ResponderExcluirParabéns pelo seu talento!
Sucesso.