sábado, 15 de abril de 2023

 

                      

Carregada. Equilibrando nos braços as compras na fila do supermercado.

Olho para o lado e vejo uma pessoa na mesma situação. Dou um sorriso e ela retribui.

Talvez devêssemos ter pegado cestas... pelo jeito pensamos dar conta por serem poucos itens a comprar, "nunca é". É a tal flexibilidade, elasticidade ou o glorioso “ultrapassando limites”.

 Mais alguns passos e o tão esperado alívio viria. O balcão do caixa agora lembra a linha de chegada da São Silvestre. Eu sei, exagerei (risos).

 A questão é: e até lá?!  inspira, expira, muda de mão, troca a posição do corpo, mexe e remexe, confere quantos clientes tem a frente, cronometra o tempo de atendimento, quase desiste (está com fome), pensa em jogar tudo no chão (desculpe, já passou).

 idealiza uma reunião com a gerência para reivindicar cadeiras na fila única e faz um juramento: nunca mais esquecer das sacolas retornáveis. Ah, e só pegar o que estiver na lista.

Passado o desabafo duplo; sim, sou solicita com a vizinha equilibrista e incluo o plural nesta narrativa. Em muito breve esticando a coluna, alongando pescoço, tirando a dormência muscular, será possível sobreviver, somos fortes.

Mas e depois? Quando sairmos e formos para casa, trabalho, para rotinas necessárias, para a vida? Vamos continuar carregando o mundo nas costas? Ultrapassando os limites próprios, abraçando uma sobrecarga emocional muitas vezes de outras pessoas?

O episódio compras de uma mulher polvo foi a parte visível, concreta, objetiva. Será que no cotidiano não temos também equilibrado, com doloroso jogo de cintura, grandes e múltiplos sentimentos, emoções, rancores... acreditando que não tenha outro jeito? 

- Eu consigo

- Deus me ajuda

- Só mais essa vez

- é por uma boa causa

- Sempre tem um jeitinho

- Vai passar

E a saúde física fica onde? Pedindo socorro! e sem percebermos viramos contorcionistas da vida. Realmente precisamos de tudo o que temos, fazemos questão de transportar, manter?

Voltando ao cenário inicial: atrás de mim, na fila reflexiva um homem, com um item somente e com um semblante leve, sereno. Não o vi olhando no relógio, emitindo ondas para acelerar o tempo, talvez não conjugue mais o verbo “demorar”.

A verdade é que desejei por uns segundos estar no lugar dele; sem pesos, e dores no corpo. Embora eu não estivesse carregando supérfluos, a situação me levou ao encontro com o subjetivo. Lá onde estava precisado silenciar e escutar, perceber o real espaço que existe e não o lotar. Respeitar o nosso eu.

Uma questão de hábitos libertadores, eles estão prontos a serem adquiridos. 

Texto: Cândida Carpena
 Ilustração: Jornal Rio de Flores

Cândida Carpena, nasceu em 01/06/71, em Pelotas-RS. É cronista, autora independente e super leitora. Atualmente reside em Brasília/DF. Sua temática literária está em um outro olhar, em percepções e vivências do real, que inspiram. Seus Projetos, “Live Cândida C. Cronista”, no Instagram e, Piquenique Literário Cultural Itinerante, presencial; buscam a interação entre as pessoas e a literatura. Publicou “Sobre Crônicas de Uma Viajante” em 2021, participou de duas Antologias, da Feira de Literatura do MAB/DF e 36º Felib/DF. Membro do Empório da Poesia/CE e do GAEB/DF.  Publicações em revistas, blogs e jornais digitais.  Parceira oficial Rede Sem Fronteiras/Portugal e autora representada, na 92ª Feira do Livro de Lisboa.
 
Edição e Direção
Renato Galvão




 

 

2 comentários:

  1. Parabéns querida Cândida Carpena pelo belíssimo texto! Adorei a leveza da escrita, dá gosto de le. Parabéns ao Jornal Rio de Flores na pessoa do Renato Galvão! Está lindo com uma outra cara. Essa nova nuance trouxe vida ao nosso jornal!

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