Por
muitas vezes, nos tempos que trabalhei na Defesa Civil Federal, à época ligada ao
Ministério do Interior, tive oportunidade de manter conversação com gente de
todas as partes do Brasil. Foi lá que entendi quando alguém usava falar sobre
os “brasis”! Assim, brasis, no plural! Que País fenomenal, “gigante pela
própria natureza”, tantas vezes exaltado, sem que o povo soubesse o
significado!
Trabalhando
com gente de todos os cantos do País, acostumei-me a conversar respeitosamente,
em variados tipos de “dialetos” verde-amarelos, alguns originários de típicos e
simples modismos históricos ou resultantes de migrações, quando não chegando
mesmo a serem únicos, exclusivos de determinados estados ou microrregiões. Em
alguns casos, já se pode dizer da possibilidade de estar a surgir a versão
abrasileirada do idioma português, ou até mesmo quando os acordos ortográficos
e tratados lusófonos são esquecidos ou desqualificados. Conjeturando sobre esse
fenômeno, para entender melhor questões filológicas, cheguei a crer que a
língua portuguesa é mais do que apenas o idioma oficial; acredito que o
português se transformou, para os brasileiros, numa forma de cimento fonêmico,
adicionado ao “concreto-linguístico” da nossa nacionalidade!
Sim,
é um berço enorme que espelha a nossa grandeza, por meio de um povo multiétnico,
habitando terras que apresentam uma das maiores biodiversidades do Planeta! Aos
povos originários, vieram juntar-se pessoas de todos os lugares do mundo. A
mobilidade social, principalmente nos últimos períodos de pós-guerras mundiais,
deu ao brasileiro uma riqueza de misturas, com culturas, sotaques, e
sonoridades inigualáveis. No Brasil Colônia falavam a Língua Geral, em nada
parecida com o Português. Em 1758, foi proibido o ensino da linguagem geral,
sendo então obrigatório o uso da língua do colonizador português. Embora
proibida, a Língua Geral, tal como o fenômeno de miscigenação, não foi fácil de
controlar; resultando na ilegalidade prática, pela força das chamadas variações
linguísticas com o uso popular do idioma. O rápido crescimento da população da
Colônia, levou o povo a necessitar de se comunicar! Assim, resultou o
surgimento de diferentes sotaques populares do idioma geral, conforme variações
do tupi.
Na
minha vida, como artista plástico, igualmente, tenho convivido com questões
assemelhadas, no tocante às abordagens temáticas naïfs, onde elas remetem à
natureza e aos cotidianos variados desses brasis! Gosto dos sotaques que podem
ser encontrados, em todos os cantos, alguns engraçados, outros embolados e
cheios de “xschiados”! Pessoalmente, tenho uma preferência! Sem desmerecer as demais
formas de sotaques, tenho uma simpatia muito grande pelo jeitinho dos mineiros,
daqueles que falam o mais genuíno... “Uai, sô!”, bem manso e com aquele sabor
de café e pão de queijo, nascido no miolo das tradições, tal como verdadeiro “dialeto”,
só encontrado nas Minas Gerais, repleto de mineiridades, sem perder as raízes
lusitanas.
O
quadro aqui apresentado, surgiu após uma viagem que fiz, para conhecer a
encantadora cidade de Tiradentes, cujo nome é uma homenagem ao herói da luta
pela independência, Joaquim José da Silva Xavier. A pintura, em estilo naif,
usa a imagem simples da histórica Estação Ferroviária, numa composição metafórica,
com figuras imaginárias, que dão sentido ao título “Junta os trem muié, que-ê-vem
a coisa!”. Trata-se de uma alusão ao jeitinho mineiro de chamar tudo de trem e
acabar por denominar a Maria-fumaça de coisa!
Mais
do que uma simples alusão à mineiridade, considerei essa pintura como uma maneira
carinhosa de homenagear meus queridos amigos mineiros.
Por
conta dessa forma peculiar e gostosa de oralidade no conversar, o povo de Minas
Gerais, é alvo “argumas-vêis” de piadas e memes. “Ói só éça!” Outro dia, ouvi o
comentário: - “a migração de Valadarenses, para os Estados Unidos da América, foi
tão grande que chegaram a cogitar sobre a possível mudança do nome do Estado
Americano do Wyoming, para
Uai-Hômi!” Falando sério! Esse sotaque é
tão simpático e acolhedor, que eu recomendo a quem pensa passar umas boas
férias viajando, por Beagá e cidades históricas mineiras, pesquisar na Internet
os sites que ensinam o idioma mais falado naquela região, com o sotaque típico do mineirês!
Só assim o viajante poderá se comunicar e entender corretamente as perguntas e
irá responder de forma gentil, aos simpáticos habitantes de lá, quando perguntarem sobre um “trem” qualquer.
Lembre-se de que trem não é apenas o trem, mas que serve para designar qualquer
coisa; porém, tenha cuidado, porque “coisa” nem sempre significa a Maria-fumaça
do trem, mas “coisa” sempre será um trem qualquer”! Entonce, fiquesperto..., çôo!
Viva, viva, viva! Viva Minas Gerais!
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“Junta
os trem muié, que-ê-vem a coisa!” Por Rocha Maia - 2006 Direção Geral: Renato Galvão Luiz Roberto da Rocha Maia.
Nasceu no Rio de Janeiro/1947. Morou em Teresópolis e Brasília e, atualmente,
em Rio das Ostras. Em 2023, completa mais de cinquenta anos de atividade
cultural. Membro de diversas entidades culturais, no Brasil e em Portugal, é
Fundador da Associação Candanga de Artistas Visuais - Brasília /DF. Membro da
Academia Brasileira de Belas Artes – ABBA do Rio de Janeiro; e da Academia de
Letras e Artes ALEART, Região dos Lagos/RJ. Participou de mais de duzentos
eventos de artes no Brasil, Cuba, Portugal, França e Bulgária. Recebeu mais de
setenta premiações e destaques em salões de artes plásticas.Citado em catálogos
e sites, possui obras expostas em galerias no Brasil e no exterior; bem como
nos acervos do Museu Naïf de São José do Rio Preto/SP; MIAN/Rio/RJ; SESC/SP, na
coleção do Château des Réaux; e do Museu Internacional de Arte Naïf de Vicq, na
França. Seus quadros estão presentes também em pinacotecas de diversas
entidades e coleções de aficionados por arte naïf no Brasil, Cuba, França,
Itália, Espanha, Chile, Japão, Bolívia e Portugal. Por três vezes foi
selecionado para a Bienal Naïfs do Brasil, tendo recebido o prêmio aquisição
2006, em Piracicaba/SP. Na literatura, publicou o catálogo “Ingenuidade
Consciente”, Editora A3 Gráfica e Editora – 2010; o livro “O Diário de Lili
Beth”, pela editora Viseu – 2021; e colaborou com a Coluna Arte Animal, da
revista digital Animal Business Brasil, escrevendo artigos versando sobre a
presença de animais como tema nas belas artes. |



Grande artista nos pincéis e nas letras.
ResponderExcluirQue a arte sempre te aco.panhe.
Belíssimo texto e obra maravilhosa!!!
Uai, que trem interessante sô!
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